Percurso de
aquisição e desenvolvimento da linguagem infantil: Morfológico e Sintático
“Uma
palavra isolada ainda não expressa um juízo completo, uma ideia completa.” (Machado,
1994) Mas a frase não só designa algum
objeto ou fenómeno, mas também um determinado pensamento ou acontecimento.
Sendo assim, a frase ou a oração são a unidade fundamental da comunicação.
“O
carácter particular da linguagem que o adulto dirige à criança fornece indícios
que lhe permitem progressivamente compreender o discurso de outrem.” (Machado,
1994) A criança compreende as palavras mais simples
e mais repetidas ao longo da sua vida como comer, passeio, dormir, bem como as
que designam objetos familiares como a chucha, biberão, ursinho. “A criança
constrói a sua linguagem a partir daquilo que ouve.” (Machado, 1994)
MORFOLÓGICO
A morfologia
é a disciplina da linguística que estuda a estrutura interna e os processos
morfológicos de formação de palavras. Neste sentido o seu objeto específico é o
conhecimento das palavras, dos seus elementos constituintes, da sua estrutura
interna e das relações entre elas.
“As
palavras isoladas com as quais se inicia o desenvolvimento da linguagem da
criança, são na realidade <orações de uma só palavra>, que estão ligadas
a uma ação real.” (Machado, 1994) Sendo
assim, a criança ao proferir a palavra <boneca> poderá estar a dizer
<dá-me a boneca> ou <toma a boneca>.
“A
criança não é capaz de produzir um enunciado da dimensão de uma frase. Através
da entoação, da mimica e do gesto, a criança tenta tornar o seu enunciado
explícito.” (Machado, 1994) Sendo assim, os meios de comunicação não
linguísticos, são meios que a criança pode utilizar para poder expressar o que
ainda não consegue transmitir através da fala. Com isto podemos através da simples
palavra <dói-dói>, acompanhada de informação não linguística, subentender
a mensagem da criança que poderá querer dizer <olha, estou ferido na ponta
do dedo>, ou <olha o dói-dói, isto é, a marca vermelha que eu tenho na
ponta do dedo>, ou ainda, <eu bato nesta porta que m fez um dói-dói há
bocadinho, ela é a culpada de eu ter um dói-dói>. “dói-dói pode ser uma
frase, uma palavra, pode qualificar um objeto, ou até lançar um apelo ao adulto
com recurso à ficção.” (Machado, 1994)
“Se
a palavra isolada designa um objeto e o generaliza, a frase é a expressão de um
pensamento, de um juízo determinado.” (Machado, 1994) Sendo assim, a frase ou a
oração são o resultado da associação de palavras isoladas.
“Certas
palavras são apenas elementos de um grupo de palavras mais complexo.” (Machado,
1994) Isto quer dizer que existem palavras que necessitam de outras palavras
que as complementem, pois por si só não tem significado. Como por exemplo.
·
Amar
– exige o que responderia “a quem?”
·
Comprar
– evocaria o que responderia “o quê?”
A
palavra é a unidade lexical máxima da morfologia, possui som e significado e
tem como constituintes e tema e o (s) sufixo (s) de flexão.
Todas
as palavras são formadas por morfemas, estes são as menores unidades
linguísticas que têm significado próprio.
As
categorias de palavras estudadas pela morfologia são: advérbio, adjetivo, nome
e verbo.
O
processo morfológico é uma operação que consiste na associação de constituintes
morfológicos (morfemas), tendo em conta as suas propriedades. Permitindo a
formação de palavras simples (formada por um único constituinte morfológico,
radical, pelo constituinte temático e pelo sufixo de flexão) e complexas
(formada pelo constituinte temático, pelo sufixo de flexão e por mais de um
constituinte morfológico, podendo ser formada por derivação ou por composição.
As
palavras organizam-se em unidades de significado mais amplas e de acordo com
regras específicas. As regras de organização das palavras em frases fazem parte
do conhecimento sintático que é apreendido pela criança durante toda a
infância.
À
medida que o conhecimento lexical da criança aumenta, os enunciados que produz
vão ganhando a forma de frases que obedecem às regras da língua em que a
criança vive e convive.
A sintaxe
é a combinação das palavras na frase, ou seja, é a necessidade que a criança
encontra de organizar o seu discurso numa frase para que a sua mensagem seja
entendido pelos outros.
Com
a passagem da palavra para a oração surge um novo principio de organização da
linguagem e da fala, denomina-se principio sintagmático. “É sabido que as
orações, tanto simples como complexas, não aparecem repentinamente na criança,
mas formam-se através de um processo de prolongado desenvolvimento.” (Machado,
1994)
As
palavras que entram na oração formam discursos breves, que são nada menos nem
nada mais que formulação de ideias, de acontecimentos ou juízos. “...nos casos
mais simples, limitam-se apenas ao sujeito e ao predicado (a casa arde). Nos
casos mais complexos , incluem sujeito, o predicado e o complemento (a menina
toma chá).” (Machado, 1994). Sendo assim, são formadas orações que tem
capacidade para expressar qualquer ideia ou pensamento.
“As
estruturas sintáticas desempenham uma importante função na memória, porque as sequencias
de palavras recordam-se melhor dentro de uma estrutura do que em forma de
lista.” (Machado, 1994)
Entre
os 18 e os 20 meses “....a criança começa
aproximar duas unidades ou dois signos que se apresentam muitas vezes
soba forma de unidades de duas sílabas:
CVCV + CVCV (consoantes vogais)...” (Machado, 1994) As crianças usam estas
unidades de sons para transmitir mensagens como <popó papá (o carro do
pai)> ou <pota mamã (mãe abre a porta)
“A
técnica sintática mias utilizada pela criança é a sucessão: popó papá pota
mamá, ó-ó bebé.” (Machado, 1994) Nem sempre a ordem de ocorrência das palavras,
não nos dá a certeza de que enunciada a criança gostaria de passar para o
adulto. Por exemplo: pota mamá ou mamá pota, podem significar, mãe, batem a à
porta; mãe, fecha aporta; a mãe abriu a
porta; mãe abriram a porta; mãe, deixa-me abrir a porta.
Segundo
Angel López Garcia, o estilo telegráfico
conduz a algumas ambiguidades como mamá sapato, pois pode significar
mamá põe-me o sapato, mamá tem um spaato, este é o sapato da mamá, quero que a
mamá me dê o sapato. “O estilo telegráfico é corrente nas produções das
crianças. Dura mais ou menos tempo conforme as crianças e a atitude dos adultos
que podem ou não encorajar. No entanto, ele não intervém nas estratégias de
compreensão. A maior parte das investigações mostra que a criança compreende
melhor o enunciado gramaticalmente correto do que o mesmo em estilo
telegráfico.” (Machado, 1994)
Nesta fase, as crianças usam estruturas frásicas embrionárias, não existindo
artigos, preposições, verbos auxiliares, mas impera a ordem sequencial das
palavras na frase. À medida que o desenvolvimento se processa, a
criança começa a introduzir marcas flexionais no discurso e a respeitar as
regras de concordância.
Surge o aparecimento de marcas
flexionais de género e número para as categorias nominais e por desinências
verbais que marcam uma pessoa, número, tempo e modo.
“A
criança que começa a falar ignora as dimensões e o nome das unidades
linguísticas que utiliza, não sabe se o que importa no enunciado é a ordem do
léxico ou a ordem dos elementos sintáticos. O que importa para criança è
produzir um enunciado que lhe permite fazer-se compreender.” (Machado, 1994).
No inicio da linguagem a criança, não entende se o discurso é correto ou não,
nem tão pouco isso é o mais importante para ela, uma vez que o seu principal
objetivo nesta fase inicial é ser compreendida por todos os que a rodeiam.
Segundo
Ángel López Garcia , existem quatro etapas na aquisição da sintaxe por parte da
criança. “num primeiro momento, a criança usa holófrases, isto é, palavras que
correspondem a uma oração e que tem um valor dependente do contexto. E explica
que os primeiros enunciados das crianças dão sempre expressões de uma só
palavra: mamá, cama, água.” (Machado, 1994) Estas palavras-frases com que se
inicia a linguagem são sempre substantivos, isto é, pertencem justamente à
classe de elementos que, por poder aparecer em qualquer posição da estrutura
sintática.
Por
volta dos 18 meses ocorre “A segunda etapa do desenvolvimento sintático
caracteriza-se pela aparição de estruturas duais do tipo mamá dá, mamá ali,
popó anda...” (Machado, 1994). Nesta etapa as orações apresentam-se com um
substantivo e numa palavra funcional.
Aos
24 meses surge “A terceira etapa do desenvolvimento sintático caracteriza-se
por ulteriores subdivisões da classe das palavras funcionais.... Esta subclasse
funcional dá lugar a uma tripartidação “adjetivos/ possessivos/ subclasse
funcional.” (Machado, 1994).
Por
volta dos 4/ 5 anos dá-se “A quarta etapa caracteriza-se pela aquisição da
sintaxe básica.” (Machado, 1994)
Após
a criança adquirir a sintaxe básica, começa a desenvolver “A consciência
sintática é a capacidade para raciocinar sobre a sintaxe dos enunciados verbais
e controlar, de forma deliberada, o uso das regras da gramática. Esta
competência traduz-se na possibilidade de realizar juízos sobre a
gramaticalidade de um enunciado, de o corrigir, caso esteja incorreto e de
explicitar as regras subjacentes a essa retificação” (Sim-Sim, I. & Silva, A. C.
& Nunes, C.,2008 : 63) Os juízos que as crianças
fazem sobre determinados enunciados, centram-se sobretudo no sentido ou na
ausência dele. “Assim muitas crianças aos seis anos são capazes de indicar que
o enunciado “o muro saltou o cavalo” está incorreto...” (Sim-Sim, I. & Silva, A. C. & Nunes, C.,2008 : 63)
embora se a frase for “o bebé faz barulho antes que adormecer” (Sim-Sim, I. & Silva, A. C. & Nunes,
C.,2008 : 63) leva
acriança de seis anos ter muito dificuldade e avaliar o erro. “Mesmo com
nove, anos nem todas as crianças são capazes de indicar que se trata de uma
frase gramaticalmente incorreta.”
(Sim-Sim, I. & Silva, A. C. & Nunes, C.,2008 : 63)
“A
consciência sintática pode facilitar algumas dimensões das operações de
leitura...” (Sim-Sim, I. &
Silva, A. C. & Nunes, C.,2008 : 64) “Se as crianças até aos
6/ 7 anos têm grandes dificuldades em efetuar juízos de gramaticais, a partir
dos 7/ 8 anos, quando começam a revelar algum domínio na leitura, dão um salto
significativo na eficácia que apresentam neste tipo de tarefas.” (Sim-Sim, I. & Silva, A. C. & Nunes,
C.,2008 : 64)
“...
a consciência sintática facilita os processos de compreensão, nomeadamente no
que diz respeito à integração das informações lidas num texto, já que a capacidade infantil para refletir sobre a
dimensão gramática dos enunciados irá possibilitar-lhes a monotorização do
sentido do que está a ser lido.”
(Sim-Sim, I. & Silva, A. C. & Nunes, C.,2008 : 64)
Para
uma criança poder desenvolver a base básica da sintaxe, bem como a consciência
sintática e morfológico, os educadores tem um papel fundamental nessa
aprendizagem, estimulando e orientando as crianças para uma vasta escolha de
ambientes favoráveis ao desenvolvimento destas competências. Logo “É no clima
de comunicação criado pelo educador que a criança irá dominando a linguagem,
alargando o seu vocabulário, construindo frases mais corretas e complexas.,
adquirindo uma maior domínio da expressão e da comunicação que lhe permitem
formas mais elaboradas de representação O quotidiano da educação pré-escolar
permitirá, por exemplo, que as crianças vão utilizando adequadamente frases
simples de tipos diversos: afirmativa, negativa, interrogativa, exclamativa,
bem como as concordâncias de género, número, pessoa e lugar.” (Sim-Sim, I. & Silva, A. C. & Nunes,
C.,2008 : 65)
“Procurar com as crianças informações em
livros, cujo texto o educador vai lendo e comentando de forma a que as crianças
interpretem os sentidos, retirem ideias principais e reconstruam informação, e
também (...), consultar um dicionário.”
(Sim-Sim, I. & Silva, A. C. & Nunes, C.,2008 : 65)
Bibliografia
Sim-Sim, I. & Silva, A. C. & Nunes, C. (2008).
Linguagem e Comunicação no Jardim-de-infância, textos de apoio para educadores
de infância. (Editorial do Ministério de Educação). Lisboa: Ministério da
Educação.
Machado, J. B., (1994), Letras & letras, O
desenvolvimento da Sintaxe, Ensaio, Acedido a Dezembro 2, 2014, em
http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/letras/ensaio33.htm